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Da Namíbia ao Oriente Médio: Um Histórico Genocida e como a Alemanha insiste em flertar com crimes contra a humanidade

Não considero justo que as atuais gerações sejam julgadas pelos erros de seus antepassados; se seguíssemos essa lógica, estaríamos todos fudidos. Contudo, acredito que a responsabilidade de cada ser humano é fazer melhor, agir de forma diferente e, sim, não poupar esforços para corrigir a herança histórica que recebemos. Isso é especialmente verdadeiro no caso da Europa, que herdou — ou melhor, roubou — inúmeras riquezas de suas colônias africanas, asiáticas e americanas. Apresente-me apenas uma capital europeia, com suas belas ruas e magníficos museus, que não seja fruto do roubo colonial, da exploração, e do sangue, lágrimas e suor dos oprimidos.


Mas o foco aqui é uma república específica: a Alemanha. – E por que a Alemanha? Embora muitos governos, como os da França, Espanha e Portugal, tenham se posicionado contra o genocídio em curso na Palestina e no Líbano, suas declarações muitas vezes, não passam de palavras vazias "para inglês ver". Por outro lado, o governo alemão de Olaf Scholz não hesitou em apoiar mais um genocídio, utilizando sua força policial para reprimir os manifestantes que tomam as ruas de Berlim a Frankfurt, gritando "chega, basta de genocídio!".


Vamos deixar de lado o episódio do Holocausto nazista, uma história amplamente conhecida, e focar em outro genocídio cometido pelo governo da Alemanha — uma história que permanece empoeirada nos livros de história, sem que ninguém se dispa de sua ignorância para lê-la.

 


O Genocídio Herero e Nama

Um dos primeiros genocídios do século XX foi perpetrado pela Alemanha no território atualmente conhecido como Namíbia. Recém-unificada e ávida por seu "lugar ao sol", a Alemanha estabeleceu sua presença no sudoeste africano com um ímpeto que só os verdadeiros colonizadores possuem. Entre 1904 e 1908, o genocídio dos povos Herero e Nama não foi apenas uma tragédia isolada, mas um ato brutal que resultou na morte de dezenas de milhares de indivíduos de etnias que, por muito tempo, permaneceram à sombra da memória coletiva.


Não contentes em confiscar terras, os governantes alemães se sentiram no direito de "civilizar" as tribos que consideravam "selvagens", impondo leis que restringiam os direitos das populações indígenas. A violência começou quando os Herero e Nama resistiram à invasão e às políticas de apropriação de terras.




Em 1904, os Herero se revoltaram contra as opressivas políticas do governo colonial, desencadeando uma resposta militar severa por parte da Alemanha. Após a revolta, as tropas alemãs, sob o comando do general Lothar von Trotha, iniciaram uma campanha de extermínio contra os Herero. O exército colonial matou indiscriminadamente homens, mulheres e crianças, forçando os sobreviventes a se refugiar no deserto de Omaheke, onde muitos sucumbiram à sede e à fome.


Os que sobreviveram ao massacre foram enviados para campos de concentração, onde a morte lenta e agonizante se tornou seu destino mais provável. Muitos Herero e Namas foram aprisionados em campos como o de Shark Island, onde foram submetidos a trabalho forçado, doenças e condições desumanas. Parece que a moda dos “campos de concentração” nunca mais saiu de moda.


Estima-se que cerca de 80% da população Herero e 50% da população Nama foi exterminada.


Enquanto o mundo avançava em direção à modernidade, a história do genocídio na Namíbia foi relegada a um canto escuro, ignorada por muitos e silenciada por interesses geopolíticos. Em meio a essa sombra, ocorreu o que conhecemos como o Holocausto nazista. O papel da Alemanha não se limitou a estar do lado errado da história; a nação foi protagonista de genocídios. Contudo, o governo alemão, em uma tentativa de reconhecer seus erros, começou a abordar essa parte obscura de seu passado.



 

Reparação histórica

 

Entre 1945 e 1949, os julgamentos de Nurembergue ocorreram, onde líderes nazistas foram processados por crimes de guerra, incluindo o genocídio de judeus. Em 1970, o governo alemão começou a reconhecer oficialmente o Holocausto como um crime contra a humanidade. Já em 2000, sob a liderança de Gerhard Schröder, a Alemanha reconheceu formalmente o Holocausto e se comprometeu a pagar reparações aos sobreviventes e instituições judaicas.


No entanto, o genocídio dos povos Herero e Nama na Namíbia, que ocorreu quatro décadas antes do Holocausto nazista, só foi reconhecido oficialmente em 2015. E, diferentemente do reconhecimento do Holocausto, a Alemanha não pagou reparações diretas por essas atrocidades. Embora a dor não possa ser quantificada em termos monetários, tais reparações poderiam contribuir para a construção de novas memórias, representando um ato de humanidade.


A história do genocídio na Namíbia não é um eco distante do passado, mas um alerta urgente para o presente. Em tempos em que injustiças ainda persistem, como as cometidas pelo regime sionizta na Palestina e no Líbano, a Alemanha continua a apoiar e armar esse regime genocida, enviando, inclusive, recursos disfarçados de reparações históricas, conforme denunciado por Norman Finkelstein em seu livro “A Industria do Holocausto” (FINKELSTEIN, 2001).


O que desejo enfatizar, de forma clara e direta, é que a Alemanha não apenas repete os erros do passado, mas também financia genocídios contemporâneos. As reparações são frequentemente mediadas por interesses políticos e econômicos que lhe são favoráveis. Para o povo alemão, que não compactua com tais atrocidades contra a humanidade, é essencial escolher melhores líderes e lutar por mudanças domésticas. Enquanto as pessoas saem às ruas para protestar contra o genocídio, a Alemanha se transforma em um palco para o ressurgimento de regimes de extrema direita e novos “Hitlers e Natanyahus” (VERMES, 2014), perpetuando a lógica da necropolítica que já marcou sua história.

 

Se os alemães não se comprometerem a tomar as dores da história e a lutar por políticas mais justas, nunca haverá um governo que não repita os mesmos erros do passado. Povo alemão, em quantos anos vocês estarão pagando indenizações pelos crimes cometidos contra os palestinos, libaneses e toda a humanidade que seu governo insiste em alimentar?

 

Referências

FINKELSTEIN, N. A Industria do Holocausto. São Paulo. 2001.

VERMES, T. Ele Está de Volta. Editora Intrínseca. São Paulo. 2014.

 

 

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