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Foto do escritorSiqka

Shukran Falestine

Saímos de casa há trinta e poucos dias à procura da Terra Santa. Porém, encontramos diversos conceitos para “Terra Santa”. Tantos que não há mochila ou mala grande o suficiente para colocar.

 

Na Turquia aprendemos que o conceito de santidade está profundamente vinculado ao conceito de “liberdade”. Se nos perguntarem se encontramos a santidade na Turquia, podemos dizer que sim. Na Capadócia reviramos igrejas cristãs primitivas esculpidas em cavernas; em Istambul vislumbramos mesquitas tão antigas quanto o próprio Islã. Entretanto, Izmir nos ensinou que a verdadeira santidade repousa na diversidade religiosa e em sua liberdade de escolha individual. No passado, os turcos tiveram liberdade para escolher a própria religião, e assim o fizeram; mas também optaram por manter um estado secular livre da imposição religiosa. Fé e espiritualidade existem em cada indivíduo de maneira diferente, portanto, um estado tão plural como a Turquia não pode ser livre e democrático se impuser os dogmas de uma única religião. Encontramos a Terra Santa na Turquia exatamente pelo fato dos turcos poderem escolher por sua própria vontade o que consideram ou não santo.

 

Para a Palestina. Ah, Palestina! Mãe de tantos mártires e heróis; essa carregamos em espaço cativo no coração. Se encontramos a Terra Santa aqui, sim! Em coisas completamente diferentes das quais pensávamos. Encontramos a santidade, não em igrejas, muros, mesquitas, tumbas, sinagogas ou estações da Via Crucis. A santidade palestina reside em seu povo. Santidade que descobrimos um pouco devido aos amigos que fizemos; outros tantos pelas histórias que ouvimos; pelas coisas que vimos; e claro, por todas as lágrimas que derramamos juntos.

 

Agora, a caminho de casa, ou pelo menos da cidade onde nasci, relembro todos os momentos vividos nos últimos dias e aproveito para reler algumas notas escritas. Abro a primeira, qual já nem lembrava ter escrito; nota que escrevi ao começar esta viagem, justamente quando fazia o caminho oposto ao que faço agora.

 

“Estou cruzando São José dos Campos. Olhando pela janela percebo como essa cidade mudou nos 13 anos em que já não vivo mais aqui. Observo as mudanças externas e reflito como eu também mudei nesses últimos 13 anos. Mas assim como São José, apesar das mudanças, ainda preserva muito do que a torna a cidade que é – seja para bem ou para mal – assim como eu – seja para bem ou para mal. Gosto de pensar que estou completamente desenraizado, principalmente quando deixo a cidade passar sem olhar para trás, mas como disse, ainda tenho minhas raízes conectadas nesta terra como um cordão umbilical, que não consigo ou não quero que seja cortado.” 1 de janeiro de 2023.

 

Relendo essa pequena nota, entendo que saí para procurar o que sempre esteve diante de meus olhos; algo que os palestinos descobriram há muito tempo. Explico: passamos por checkpoints com os palestinos; vimos casas sendo demolidas pela ocupação; sentimos medo durante a noite; viajamos em transporte público; ficamos presos em estradas; fomos humilhados por soldados; choramos juntos por jovens assassinados no meio do dia. Por outro lado, rezamos juntos; jantamos no mesmo prato – como de costume; cuidamos da terra; podamos oliveiras; sorrimos, nos divertimos e, acima de tudo, amamos e nos sentimos amados. Dessa maneira entendi que a Terra Santa, para os palestinos é sua própria terra; onde eles vivem ou sonham em viver com todos aqueles que amam. É por essa terra que os palestinos morrem, para que um dia ela seja liberta e seus entes queridos possam retornar.

 

O conceito de Terra Santa é diferente para turcos, israelenses e palestinos, tão quanto é para mim, para Di, ou para você caro “leitor”. No último mês procurei pela santidade em três países diferentes, encontrei vários conceitos, mas nenhum era o meu. Olhando para o lado vejo a minha própria Terra Santa, ela estava no mesmo lugar onde sempre esteve: sentada na poltrona ao lado olhando pela janela.


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